sexta-feira, março 23, 2007

ERA


Não era por pressa que meu coração
Descompassava meus instintos
Era ansiedade

Tomei um banho carinhoso
Depilada, cheirosa e úmida
Era saudade

Escolhi sua blusa preferida
Creme no corpo inteiro
Era paixão

Fui até nossa árvore
Saudades flutuavam dentro de mim
Era ninfa

Sua vontade eu sentia
Minha liberdade, eu abdicaria
Era prisão

Sentindo o mundo rodar
Esperei
Era eternidade

Vieram as rugas
Você não
Era apenas solidão.

sábado, março 10, 2007

CANTIGA PARA NÃO MORRER


Ferreira Gullar

Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.

Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.

Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.

E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.

terça-feira, março 06, 2007

VULCÃO

Li em algum lugar e gostei...


Não, não vou mentir...
Você é um vulcão
Arde em chamas e fogo
Incendeia quem se aproxima
Se pega vira pedra
Cinzas e pó
Por quê?
Tão quente e tão suave
Tão fresca e lascivante
Tão gente, tão mística
Tão humana e tão deusa
Quem é você afinal?
Sem mascaras num corpo de mulher
Esgarça todo o nosso ser
Dele fez subjugar-se aos tentáculos
Ama,
Atraia,
Envolve,
Acasala,
Enrola,
Imola,
Enternece,
Triunfa
Extasia...
São tantos ais
Tantas coisas no arfar
Delírios mil e sem fim
Caminhar em nuvens
Pousar no espaço
Ser iluminado e ser
Seres mais do que o pensado
Ser o "eu" menos do que o imaginado
Minha guerra,
Minha derrota,
Muita luta,
Muito Amor.


Como valeu!
AA

sexta-feira, março 02, 2007

PARODIANDO

Bruna Lombardi


O que eu amo em ti
não é esse jeito de cereja
e esse olhar de seis da tarde
não é essa mania de andar bolerodiando
nem mesmo a tua educadez

O que eu amo em ti
não é essa tua boca de vinho
nem o teu piano. Tocas. E nem é isso.
Os livros que leste, nem mesmo
o que sabes ou não sabes
Não é tampouco o teu ambicionismo
ou teu traço de desenho ou o compasso.

Nem teu andando em lenta marcha vagarosa
nem a doçura, a ternura, a candura,
a loucura, a pura frescura tua de alface...
nem mesmo teu cheiro de alface
teu cheiro de ar com um resto de perfume
nem teu carro (com ar condicionado)
nem teu cachorro
não, não é nem isso que eu amo em ti.

O que eu amo em ti
não é a tua preguiça esticada ao sol
emsombreada de impressionismo
não são os silêncios de que és feito
nem o instante que povoas
ou o mistério que às vezes te povoa,
Não é esse ar letárgico, trágico, trístico,
tanguístico, místico com que te sentas na cadeira
ou acendes um cigarro
somente para por um pouco de fumaça
entre ti mesmo e o mundo

Não é tua voz irônica e sábia
que me preenche os brancos da cabeça
nem mesmo tua cabeça ou tua espiritualidade
ou tua força, tua certeza ou tua fragilidade
Acaso tua beleza? Não, nem é isso.

Nem mesmo o que eu amo em ti
é a tua gargalhada
que transpassa meu ouvido
cheia de espuma e sol de agosto
com gosto de aventura
ou o teu beijo
que cada vez me sabe a uma coisa
mas é sempre tão beijável.

Não é teu jogo de tênis (tão branco de propaganda)
recortado no horizonte,
nem teu corpo plástico, elástico, cheio de fluxos
e de percursos de vibração.
Não é bem isso.

Nessa sucessão constante de agoras
o que eu amo em ti
não é o que refletes de improviso
nem é o inesperável
nem o superalgo

O que eu amo em ti
...são as rugas, meu amor, as rugas...


NOTA: Esta não escrevi para o "Senhor das minhas noites" porque a Bruna escreveu tão bem antes de mim. Mas saiba, "Dono dos meus dias" que ela escreveu justamente o que mais admiro em você: as rugas que, ao longo da nossa relação, vi nascer.