sexta-feira, dezembro 29, 2006

PÊ CÊ - Conto


Os surtos estranhos começaram de uma forma branda, quase imperceptivelmente, mas com o passar do tempo as crises foram aumentando sua freqüência, ele começou a ter altas variações de pressão e palpitações.

Um dia acordei de madrugada com ele dando uns estalidos estranhos e quando fui medir sua temperatura anal fiquei horrorizado. O pobre coitado estava com 94º de febre. Quando olhei para o monitor, piscavam luzes coloridas. Comecei a achar que ele estava tendo um surto de comportamento esquizo-afetivo do tipo paranóia. Tentei acessar meu caderno de endereços, mas foi em vão. Nenhum dos sinais vitais estavam compatíveis com a normalidade.

Procurei pelas gavetas o velho e bom caderno de endereços de papel e achei em baixo de um pouco de poeira, resguardado por algumas teias de aranha, mas o bolor não chegou a tomar conta e desgrudando as folhas amareladas achei o telefone do Doutor Kanalha. Pedi que viesse com urgência, que eu pagaria o adicional noturno, mas que não podíamos deixá-lo morrer assim, sem assistência.

Doutor Kanalha examinou por horas a fio meu pequeno amigo. Conseguiu tirá-lo da crise e deixou uma receita para eu avia-la no dia seguinte. Era para dar 40 comprimidos de Lactopurga, 1 frasco de Luftal e 50 comprimidos de novalgina que ele iria ficar bonzinho.

Fiz exatamente o que o Dr. Kanalha prescreveu, mas a febre tinha voltado e ele estava começando a ter algo parecido com uma convulsão. Liguei para o consultório do médico, mas ele tinha saído e quem me atendeu foi sua enfermeira. Disse que o médico tinha pedido para eu comprar um frasco de Haldol, pois meu amigo poderia vir a ter um forte surto esquizóide como agravamento de uma leve paranóia que ele já vinha apresentando.

Dois dias se passaram e nenhuma melhora. A memória do meu amigo tinha sofrido uma coisa parecida como "estouro da pilha" e ele passou a ter apenas uma vaga lembrança das coisas mais sérias. Como não vi nenhuma melhora, decidi ligar novamente para o consultório do médico.

- Consultório do Dr. Kanalha, em que posso servi-lo?
- Boa tarde senhora... senhora...
- Senhora não, senhorita, por favor, senhorita Kibundah, sou a enfermeira do Dr. Kanalha. Em que posso ajudá-lo?

- Sta Kibundah o Dr. Kanalha atendeu ao meu chamado essa madrugada...

- É o Sr. Tadeu Tadando que está falando?
- Sim.
- O Dr. Kanalha deixou outra receita comigo, caso a medicação da madrugada não desse certo. O Sr. Pode passar aqui até às 17h para buscá-la.
- Sim senhora, já estou indo aí.

Em 15 minutos eu estava chegando ao consultório, peguei a receita, agradeci e parti pra dentro da farmácia, meu amigo tinha piorado muito. As convulsões tinham recomeçado.

O balconista da farmácia leu a receita e perguntou:
- O senhor tem certeza que são esses remédios mesmo?
- Respondi ?sim? e pedi para ler a receita, pois com a pressa eu não tinha nem lido a prescrição passada pelo Dr. Kanalha.

Sr. Tadeu Tadando, se o Sr. Bicheira Bagaceira não tiver melhora de 24 a 72 horas entrar com a medicação de urgência que consiste em:

Diariamente e por 10 dias seguidos ministrar:
5 colheres de sopa de Agarol
Um comprimido de Gardenal
E dois comprimidos de Ascarical
OBS.: O Gardenal é apenas uma medida profilática, pois ele vai cagar as bichas todas sem ter convulsão.

Quando cheguei em casa e mostrei a medicação para meu amigo Bicheira e ele deu um pulo tão grande que pensei que estava curado. Mas que nada, ele quase saltou pela janela. Infelizmente, era só mais um de seus surtos psicóticos. Quando ele me viu pensou que estava vendo o Dr. Q Dedo que ele já conhece tão bem, um médico excelente, muito capacitado e habilitado, mas por ser proctologista meu amigo tinha horror dele.
- Porque você reagiu assim Bicheira? Perguntei.
- Pensei que o Dr. Q Dedo estava chegando para me fazer um exame, eu não quero Q Dedo! Não quero! Prefiro o suicídio!!!
- Calma amigo, só estou trazendo a medicação do Dr. Kanalha, acho que agora você melhora.

Dez dias se passaram e meu amigo continuava com febres, palpitações e às vezes nem vaga lembrança tinha mais.

Ele parecia O Malandro* do Chico Buarque:

O malandro/Tá na greta
Na sarjeta/Do país
E quem passa/Acha graça
Na desgraça/Do infeliz

O malandro/Tá de coma
Hematoma/No nariz
E rasgando/Sua bunda
Uma funda/Cicatriz

O seu rosto/Tem mais mosca
Que a birosca/Do Mané
O malandro/É um presunto
De pé junto/E com chulé

O coitado/Foi encontrado
Mais furado/Que Jesus
E do estranho/Abdômen
Desse homem/Jorra pus

O seu peito/Putrefeito
Tá com jeito/De pirão
O seu sangue/Forma lagos
E os seus bagos/Estão no chão

O cadáver/Do indigente
É evidente/Que morreu
E no entanto/Ele se move
Como prova/O Galileu

*O malandro nº 2
Kurt Weill - Bertolt Brecht - versão livre de Chico Buarque/1977-1978 para a peça Ópera do malandro, de Chico Buarque


Passaram-se os dias à base de Lamotricina, Venlafaxina, Valproato e Clonazepan.
Se bem que eu achava que seria melhor Formicida logo de uma vez, dizem que a Tatu é a melhor, deixa o intestino em tiras que nem o Pitangy dá jeito.

Mas tive que chamar mesmo o Dr. Q Dedo, que depois do seu "dedo santo", trocou o cooler, formatou o HD, deletou todos os vírus e meu amigo Bicheira Bagaceira voltou a ser o amigo que sempre foi: O MELHOR PC DO MUNDO.

quinta-feira, dezembro 21, 2006

NATALÍCIA - Conto


Foi um ano difícil que estava acabando.

Nata ficou desempregada em abril e agora que dezembro já passava do meio e suas economias no fim; ela não sabia mais aonde ir e nem o que fazer para sobreviver.

Tomou banho, pegou sua melhor roupa e decidiu dar uma volta pelo shopping. Quem sabe desta vez tivesse mais sorte? Foi passeando, pois era perto e afinal a intenção era de ao menos se distrair com a profusão de vermelho nas vitrines.

Sentou num banco e um menino moreno se aproximou entregando um papel, ela riu, achou na bolsa uma bala e deu a ele. O menino riu e respondeu:
- Espero que você tenha um Feliz Natal. O meu não deve ser dos melhores, estou trabalhando porque minha mãe está de cama. Nata deu um beijo no menino e respondeu:
- Teremos sim um Natal bem feliz, pois traremos sorte um ao outro.

E o menino saiu rindo, um pouco mais feliz e foi continuar seu trabalho entregando papéis.

Nata viu que era um anúncio de emprego temporário e a inscrição era em uma loja ali mesmo no shopping. Levantou mais animada e foi até a loja. Sua animação não durou muito, era um sexy shop e este não era muito seu perfil, mas decidiu saber do que se tratava. Tomou coragem e entrou na loja. Foi atendida por uma jovem senhora muito educada que a convidou a entrar numa salinha reservada para que conversassem sem interrupções. A senhora explicou:
- Vai acontecer uma grande festa, mas como é na noite do dia 24 eu não consigo uma moça para fazer o serviço.
- Algo relacionado à prostituição? Nata perguntou.
- Não, a não ser que você queira. O serviço consiste em estar vestida de mamãe Noel, roupas mínimas e um pouco transparente, o corpo salpicado de gliter. Exatamente a meia noite entra na sala uma imensa caixa de presentes com a moça e os presentes que serão entregues por ela. O grupo da festa consiste em investidores da bolsa de valores e alguns grandes empresários. Todos sem família, por isso resolveram fazer esta festa em grupo. Lógico que estou agendando algumas meninas de programa também, mas eles pediram que a moça da caixa não fosse prostituta. Estas foram as ordens que recebi quando me contrataram para organizar a festa e, é lógico, que preciso de uma moça educada, de classe, pois são todos homens importantes e de muitas posses. Depois da entrega dos presentes, se você quiser, pode continuar na festa e curtir até o final.

Nata achou que o serviço não seria tão ruim assim, afinal de contas não ia ter como, ou com quem passar o Natal e a parte boa é que poderia curtir a festa depois da meia noite, mas a melhor parte era que iria receber em pagamento pelo serviço o que recebia por um mês de trabalho no seu último emprego. Saiu feliz da loja e lembrou do menino, mas não o achou pelo shopping. Num impulso voltou à loja e perguntou para a senhora que a tinha atendido se tinha o endereço, ou telefone do menino que estava entregando o folder para ela no shopping.

- Que menino? Que folder? Não pedi para entregar nenhum folder. Tenho apenas este cartaz na loja, não foi lendo o cartaz que você chegou aqui?

Nata procurou na sua bolsa, mas não achou mais o papel que o menino tinha lhe dado. Pediu desculpas e saiu da loja, confirmando sua ida à festa no dia 24.

Chega o dia e Nata está bem nervosa. Foi treinada para o serviço, experimentou a roupa, que nem era tão mínima assim, marcaram cabeleireiro, manicure e maquiagem num salão vip e isto consumiu sua tarde toda. Agora se olhava no espelho com o vestido longo vermelho, sapatos e meias que foram enviados e se achava bem diferente do seu dia a dia. Não era feia, mas seus cabelos longos, louros naturais e ligeiramente encaracolados nunca tinham sido tão bem tratados. Brilhavam, assim como seus olhos. Estava impressionada com a organização de tudo. Salão, roupas e um táxi na sua porta a esperando, até a cor do esmalte foi escolhida pela dona da loja.

Quando chega ao local se surpreende com a casa: uma mansão amarela clara em cima de uma colina e toda iluminada. Repara que no estacionamento existe uma profusão de BMW, Ferrari e outros carros que ela nem conhecia a marca, mas todos muito bonitos. Entra na sala que reservaram para ela, mais parecendo um camarim, vê no canto uma mesa com uma toalha branca, um vaso com belíssimas rosas vermelhas, uma cesta de frutas e dentro de um balde com gelo uma garrafa de champanhe. Antes que tenha tempo de fazer algo entra um garçom, lhe dá boa noite e abre a champanha, servindo um pouco numa taça e entregando a ela.

- Com os cumprimentos de todos, senhora. Precisando de qualquer coisa pode me chamar estarei aqui fora no corredor. Boa festa.

Nas rosas tinha um cartão escrito: "Feliz aniversário antecipado", mas sem assinatura. Nata sabia que não tinha falado com ninguém que no dia seguinte seria seu aniversário. Aliás, detestava ter nascido no dia 25 de dezembro, pois foi por isso que deram aquele nome bobo para ela.
Músicas deliciosamente relaxantes começaram a tocar, entremeadas com algumas antigas de Natal. Nata começou a se trocar com calma, tinha tempo de sobra.

Faltando cinco minutos para meia noite o mesmo garçom bate à porta e pergunta:
- A senhora está pronta? Chegou sua hora e a acompanha até onde estava a caixa onde ela deveria entrar e estariam os pacotes de presente que deveria entregar, mas quando Nata entra na caixa apenas uma caixa de presentes lhe é entregue. Ela pergunta onde estão os outros presentes, mas o garçom fala que só recebeu ordens para entregar-lhe aquela pequena caixa. E a caixa dourada com Nata dentro segue para a sala.

Quando a caixa se abre e Nata se levanta com o pequeno embrulho nas mãos vê um salão imenso, todo iluminado à luz de velas e decorado com rosas vermelhas. Uns vinte ou trinta casais, os homens de preto e as mulheres vestidas em tons de vermelho, e na sua frente um rapaz uns cinco anos mais velho que ela que lhe estende a mão ajudando-a a sair da caixa. Nessa hora a música pára e todos cantam "parabéns pra você". Nata entrega a caixa para o rapaz que a abre e tira um anel com um solitário de brilhante. Ele pega sua mão e coloca o anel e antes que Nata consiga falar algo ele a puxa para dançarem O Imperador de Beethoven que já começa a tocar.

O rapaz dança em silêncio e só na segunda música que começa a contar para ela o motivo da festa.
- Os casais são todos meus amigos, e resolveram me fazer uma surpresa pelo meu aniversário. Eles não se conformam que sempre saímos, eles sempre em casal e eu sozinho. Trabalho muito e não tenho tempo para paqueras, então resolveram me presentear com você, mas isso não quer dizer que você seja obrigada a nada que não queira comigo. Seu trabalho terminou quando você saiu da caixa, agora é apenas curtir a noite se assim você quiser.

Nata fala que não está se sentindo bem com aquela roupa, um biquíni vermelho com uma capa quase transparente por cima, para continuar no salão e pergunta se ele faz alguma objeção que ela se troque.

- Lógico que não! Quer que te acompanhe até sua sala?
- Sim. Mesmo porque nem sei onde fica afinal me trouxeram até aqui dentro de uma caixa.

Ele a leva até o camarim e quando entram o garçom está servindo champanhe em duas taças. Entrega a eles e se retira.

Brindam e o rapaz faz menção de sair para que ela se troque, mas Nata olha para o biombo e pede que ele a espere na poltrona enquanto se troca atrás do biombo e enquanto isso, podem conversar. Quando sai de trás do biombo ele está em pé com uma das rosas do buquê nas mãos e fala:
- Sei que parece loucura, nem nos conhecemos, mas espero que nós dois tenhamos uma noite especial.

Nata pega a flor e agindo instintivamente chega seu lábio perto do dele.

Carlos prende a rosa nos cabelos de Nata e saem para dançar.

A noite é realmente especial e se sentindo cansada de tanto dançarem pede para dar uma volta pelo jardim. Sentam-se num banco e Carlos fala de sua vida. Ficou órfão muito jovem. O curador dos bens que seu pai lhe deixou foi também seu tutor. Um homem correto e rígido na sua forma de educar os filhos e ele foi educado pelo tutor como se fosse um dos seus filhos. Começou a trabalhar em uma das empresas do seu pai com 16 anos, como boy. Seu tutor falava que se ele não conhecesse toda a empresa, jamais conseguiria administrar esta e as outras que seu pai tanto trabalhou para deixar para ele. Hoje ele agradece a educação rígida que teve, mas sabe que isso o deixou com poucas possibilidades de ter uma mulher como ele sonhava. Que não fosse do meio dele, pois achava as meninas muito vazias, sem maiores propósitos de vida que não fosse diversão. E pediu para que Nata contasse sua vida.

- Nasci no interior e vim para a capital estudar quando meus pais morreram. Sempre quis cursar música e sempre trabalhei para conseguir pagar meus estudos. Quando passei para a universidade federal comecei a achar que finalmente minha vida iria melhorar, mas trabalhar nessa área é muito difícil. Trabalhei até o começo deste ano, quando o grupo se dissolveu e sobrevivi com o que conseguia guardar do meu salário. Precisei trancar a matrícula da faculdade no começo do ano.

Nata tira o anel do dedo e fala a Carlos que não pode aceitar um presente tão caro já que mal se conhecem. Ele pega o anel e recoloca no dedo dela.

- Aceite, por favor. Apesar de ser precipitado, quero conhecer você melhor e espero que você também queira me conhecer. Sei onde te encontrar.

A festa está no final, ela e Carlos se despedem e Nata pega o táxi de volta para casa, mas o motorista toma outro caminho. Nata pergunta o porquê disso e o rapaz entrega um grande embrulho e responde que eles têm ainda algo a fazer, têm mais um presente a entregar naquela noite antes que ele a deixe em casa.

Já está amanhecendo quando Nata chega a uma casa simples. Sentado na porta um menino moreno que quando a vê abre um sorriso.

- Oi moça! Como me achou?
- Não sei, e como você me achou?
- Um moço pediu para eu entregar à senhora aquele papel e que jogasse os outros no lixo. Que se eu fizesse isso hoje cedinho eu iria receber um presentão.

Nisso Nata lembra do embrulho, volta ao carro e entrega ao menino o pacote contendo um ferrorama, um cheque e um cartão onde estava escrito: "Antonio use o cheque da melhor forma, para você e para cuidar de sua mãe, um grande beijo do seu amigo Carlos".

A partir desse Natal mágico os três nunca mais se separaram.

Melanie
18/12/2005

sábado, dezembro 16, 2006

BANHO - Conto


Ela se sentia feliz...
Esteve com ele...
Só com a voz dele, mas esteve.

Chegou em casa, pegou uma cerveja bem gelada e foi tomar banho. Adora tomar cerveja gelada em baixo da água bem quente. O corpo dela é só prazer com o quente externo e o frio interno.

Liga o rádio.

Nem acredita quando começa a tocar Norah Jones - Don't Know Why e onde quer que esteja essa música a leva a ele.

Deixa a água quente escorrer pelo corpo e pensa nele, lembra daquela voz com tom de entranhas de tão profunda, lembra do seu sorriso e imagina que ele ri com os olhos fechados, mas porque fechar o que ele tem de mais transparente, de mais Alma?

A água escorre pelos seus cabelos e seu corpo que se sente acariciado por ele. É como se ele estivesse pensando nela e ela conseguisse sentir isso. Ah! Como ela queria ele nesse banho...

O colocaria em baixo d'água aquecendo e depois correria um fio de cerveja gelada pelas suas costas, abaixaria bem rápido para bebê-la quando a cerveja chegasse na bunda. Levanta os cabelos encaracolados e compridos e a água quente do chuveiro bate na nuca, isso arrepia. Sente o bico dos seios eriçando e sonha que é ele e sua boca quente brincando com sua nuca... Toca-se, seu corpo tem urgência. Fecha os olhos, o chama e sente-o chegando de longe, bem longe...

Agora são as mãos dele, e não as dela, que tocam seu corpo e lentamente se entrega àquelas mãos, sente o calor do corpo dele mais quente que a água. De olhos fechados eles sorriem, toda a magia está nos olhos; toda a magia está no beijo, longo, doce, onde a saliva se mistura com a água e tudo escorre. Ela lembra da cerveja, pega e deixa escorrer pelas costas dele que leva um choque e geme; ela o vira e lambe; ele e a cerveja... Sente uma certa indecisão no corpo dele que não sabe se ri, foge ou se entrega, mas resolve se entregar e ela resolve brincar de lamber eternamente. Joga mais cerveja e dessa vez sua língua vai buscar no fio da coluna e desce acompanhando o fio do líquido. Os dois fios, a ponta da língua, o corpo dele são quatro elementos que se fecham um curto circuito. Ela abre suas nádegas e busca, e acha, e ele sente outro choque, e ela toca com a ponta dura da sua língua, e ele geme, e ela gosta.

Brinca e desliza a língua, passa por baixo sem desligar a língua do corpo dele e sobe. Enquanto a cerveja sai da lata tocando o mamilo, ela espera a cerveja que escorre, ele fica com sabor de tesão e cerveja. A língua dela sobe, entra no umbigo, sente os mamilos duros, passeia pelo pescoço entra na orelha, sai...

Um abraço, um ajeitar de um corpo dentro do outro e ondas de calor invadem seu corpo. Um mar feroz a possui, o vai-e-vem das ondas, o vai-e-vem do corpo dele dentro dela, a ânsia de querer, os movimentos da vagina apertando, e uma ferocidade que vem chegando lentamente. São seus próprios movimentos involuntários anunciando o poder de vida e morte, sua alma lhe foge e encontra a dele em algum lugar do etéreo num orgasmo louco e incontrolável.

Ela abre lentamente os olhos buscando onde está e sente a água quente descendo pelo seu corpo. Tem a sensação de paz e vê o resto da cerveja que ela não jogou em si mesma e bebe pensando nele e em como será quando ele estiver no lugar dos seus sonhos.

terça-feira, dezembro 12, 2006

ERA UMA VEZ...


João sempre quis muito que tudo fosse diferente na sua vida...

Ele era casado há mais de 15 anos e apesar de não pensar em traição, sempre pensou numa forma de fazer sexo diferente daquele "café com leite morno", daquele "pão com manteiga que qualquer bar de esquina oferece". Sempre pensou em algo culturalmente aceito, mas que fosse diferente na cama.

Chegou em casa e sua esposa não estava, encontrou um bilhete dizendo:

- Minha amiga Carolina está para dar a luz e estarei com ela, o telefone dela é xxx-xxxxxxx.

Abriu a geladeira, um pote com arroz, um com feijão e outro com restos do almoço, mas o que chamou a atenção foi uma garrafa de vinho tinto, um português de boa estirpe que um amigo havia deixado na casa dele num dos enfadonhos bate-papos com amigos.

Descartou os restos de comida, pegou uma das taças que Ana nunca permitia que ele "sujasse" e virou o vinho. Pensou: "mas que desperdício, não beberam nem um copo de um vinho tão bom".

Foi até a sala, apagou as luzes, deixando apenas a luz do aparelho de som, pois hoje sua casa era só sua. Buscou uma música compatível com o vinho.

Maysa começou a cantar ne me quitte pas e o vinho... Acende um cigarro. E se estica no sofá.

Bebe um copo, dois, três... e vê Ana chegando...

Vinha com um vestido preto colado no corpo que ele não sabia bem se era cetim ou seda, cabelos presos por um desses pauzinhos japoneses, uma sandália dourada e um xale que ele nunca soube se era da avó espanhola, ou de alguma puta portuguesa. Mas estava linda...

Nisso o CD começa a tocar la vie em rose e ela misteriosamente não fala nada, ele nada pergunta, pois sabe que ela estava com a parideira Carolina.

Ela pega seu maço de cigarro, seu isqueiro, acende um e traga - Mas Ana nunca fumou - se senta na poltrona, bem na sua frente e calmamente desamarra as sandálias. E ele gosta disso. Apenas olha intrigado.

Ela levanta um pouco o vestido e ele pensa "maldição! Porque não mantive as luzes acesas? Pouco vejo, só me sobrou a luz do luar". Mas na penumbra, pois não tem coragem de se levantar e estragar algo que imagina que será muito bom, consegue identificar que "sua" Ana tira a calcinha.

Isso o deixa estático! Nada consegue fazer, suas pernas e vontade não o obedecem.

Ela tira o copo de vinho das mãos geladas dele, bebe alguns goles e molha o dedo médio no líquido. Desce a mão e se toca, e o contato do vinho lhe arranca gemidos.

Ele quer ter alguma reação, mas só consegue deixar seu braço cair, cai sua mão ao colo.

Ana alterna o dedo no copo de vinho e no ato de se tocar.

Ele sente que sua mão caiu no colo e que algo pulsa em baixo dela.

Tenta desesperadamente se livrar das calças usadas o dia todo no trabalho e daquela cueca que vive a lhe reprimir. E depois de muito esforço, consegue.

E Ana cruelmente na sua viagem, vinho e clitóris...

Os sons de Ana são os mesmos sons dele, ritmos idênticos, desejos máximos explodem!

Acorda no sofá, no meio da noite, gelado de frio, todo sujo de uma gosma seca e só com a camisa, mas foi tão bom...

terça-feira, dezembro 05, 2006

MEIO SÉCULO


UM QUARTO DE SÉCULO

Um dia acordei triste, pois era virgem.
Um dia acordei, pois havia dormido um quarto de século.
Era virgem
Por nunca ter amado,
Por nunca ter olhado
E me refletido em alguém.
Um dia eu
Um quarto de século
Virgem.
Achei-me dentro de você.
Um dia virgem,
Não era mais virgem,
Era somente feliz.

junho de 1981



MEIO SÉCULO

E agora olho para o último quarto de século
Que somado ao primeiro
Soma meio século.
Meu corpo tem meio século
Mas que ritmo minh?alma imprime?
Ela é tão lenta,
Tão lerda a pobrezinha...
Já caminhei meio século
E ela lá atrás, vindo à passeio
Agora que ela chega pelo meio do caminho
Não senti o tempo correr
Talvez por correr à frente dele
Mas a alma tem idade própria
Ritmo próprio
Vem ali atrás, caminhando...
Vendo estrelas
Fazendo amigos
Distribuindo carinhos
Aprendendo o que é viver
Sem pressa para nada
Colhendo frutos
Plantando flores
Vivendo, por não ter mais nada
De interessante a fazer
A não ser
Se fazer feliz...

05/12/2006

segunda-feira, dezembro 04, 2006

CASTELO


Entro nas lendas
Torno-me uma delas
Sou coroada nesse castelo

Mas dele retiro
Pedra por pedra
Assim descortino a vida

Lanço minh'alma no ar
E essa dor não mata
Faz-me mais forte

Respiro clorofila
Encho os pulmões de água
Jogo-me rio abaixo

Sigo o curso do nada
Não nado
Apenas me deixo ir.

sábado, dezembro 02, 2006

A PRAIA - Conto


Acabo de acordar, parece que, de um sonho muito comprido. Olho em volta e não reconheço nada; nem o mar, nem esse lugar, nem eu mesma.

Acabei de acordar, meus olhos estão inchados e deve ser por isso que essa paisagem me é muito estranha. Estou numa praia, a areia é muito branca, tem uma toalha bem grande no chão, dois copos, algumas garrafas de vinho e flores em volta da toalha.

O sol nasce e é assim que me sinto também, nascendo.

Não sei como vim parar aqui, mas vejo um caminho bem estreito entre os arbustos. Por esse caminho vem vindo alguém, mas não me assusto, sinto que o conheço. Talvez não seja tudo totalmente estranho, essa pessoa talvez esteja perdida em alguma dobra do meu cérebro. Quem sabe?

Acabo de acordar e parece que a memória acorda também, lentamente como eu. Olho essa silhueta vindo na minha direção. Seu jeito de andar, seus cabelos ou talvez seja apenas a forma como passa a mão por eles, me reporta a um passado que não passou totalmente.

Fecho os olhos e as lembranças aos poucos me vêem. Lembro do cheiro e dos carinhos que me fazia, lembro do calor do corpo e de como fazíamos amor com tanto desespero; como se pressentíssemos que a vida ia nos separar. Lembro do tanto que me acariciava e do tanto que eu queria. Lembro do peso da sua mão na minha barriga e da risada gostosa que dava quando eu brincava com seu umbigo.

Lembro...

E as lembranças me vêem chegando aos poucos, tão lentas como seus passos.

Sinto que ele vem por entre os arbustos do estreito caminho, vejo uma sombra e pressinto ser...

Sua. É isso que fui, é isso que sempre vou ser. Sua.